segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Par de Botas


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Era noite, o corvo parou na janela, fazia noites que ele espiava aquela bota, aquele coturno, tão lindo, tão preto, preto como ele, ele estava apaixonado e disse para si mesmo ''hoje vou roubar esse par de botas''. Se imaginava com o maravilhoso par, tão satisfeito, quem sabe ''o Corvo de botas'',se um gato de botas rendeu um conto talvez até merecesse uma historia . Era o que ele queria, e essa era a noite. A janela do apartamento estava aberta, ele voou e pousou nela, espiou e entrou. Estava escuro la dentro e de certo ele era o único, apressou-se para agarrar o objeto tão estimado mas foi surpreendido por um som ao fundo...
-Quem esta ai?
O Corvo se encolheu, mas que azar, o dono estava em casa, odiava quando acontecia isso.
-Quem?Eu ouvi um bater de asas...é você?-Ele escutou o som de uma arma sendo engatilhada, se encolheu, espreitou e observou, era um homem, ele estava tão aflito, tinha uma foto no colo, uma arma em uma das mãos e na outra enxugava os olhos com um lenço florido.
-Sei que é você...-continuou. O corvo pareceu indeciso, não era algo que se via todo dia, na verdade, era sim, na noite passada viu coisas piores mas isso não convém, o corvo então arriscou falar.
-Sabe mesmo?-Grasnou e o homem respondeu:
-Claro que sei, você veio me levar, não foi?
-Levar?-soou espantado, como assim levar?Tudo que ele queria levar era o par de botas.-bem, não você exatamente.
-Sim, não é você aquele que leva as pessoas quando elas morrem?
-Não, não sou eu, talvez seja um engano...-Papo furado, ele queria o seu par de botas!Mas ele estava curioso, claro, naquela cidade, naquela noite, naquele mundo, ele sentia o cheiro de mais um suicídio patético, mas talvez, talvez houvesse algo mais que patético nisso, talvez algo trágico...
-Claro que é você, você é a morte e veio me levar, escutei seu bater de asas, nunca acreditei de verdade nisso tudo.
O Corvo pasmou, isso era tão cômico!O corvo adorava fingir, adorava dramatizar, ele insistiu...
-Ah, então você percebeu que chegou sua hora...
-Eu escolhi minha hora - disse o homem apontando a arma pro peito. Tão aflito, tão triste, o por que disso?
-Por que quer tirar sua vida, por que me chama?Por que tão triste?
-Por que o amor me força a isso...eu...eu falhei com ele...- o corvo observou ''ele''?Seria um tal daqueles gays como as pessoas falam?E observando a imagem no colo, reparou que realmente era de outro homem.
-O amor só força a amar.
-Mas eu não o amei, devia ter dito que o amava de verdade, eu não devia ter deixado ele ir embora, agora...agora eu, eu sinto a necessidade de pagar esse erro com minha vida.
-Bobagem!- Grasnou o corvo -Você amara de novo, a vida é um moinho, sejamos os cupins dela, não se entregue a uma derrota sem pensar em se levantar...-parou, sentiu-se satisfeito, estava falando coisas tão, como posso dizer, boas?E se ele salvasse esse homem?Talvez valesse o par de botas. Será que ficaria mais interessante se falasse alguma coisa com‘’nevermore’’?
-Não...não dessa vez, eu quero morrer, eu quero chorar, eu o amo como jamais amei alguém.
Ridículo, pensou o corvo, esses homens, jurando a Deus e o mundo que amam, que são isso e aquilo quando não conseguem lidar com eles mesmos. Aquele era um homem fraco, ele se merecia, Deus sabe que o corvo tentou, agora ele quer o seu par de botas.
Voou e pousou sobre o belo par e os agarrou, olhou para o homem e disse:
-Vou levar eles, ok?
O homem pasmou, se sobressaltou, olhou arregalado e disse:
-Minha nossa, um animal que fala!
Se não fosse tão escuro o homem teria visto o sorriso do corvo:
-Minha nossa, um homem que ama!

Um comentário:

  1. nossa adorei *-* ficou muito lindo mesmo, principalmente a ideia do final :)

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