domingo, 6 de julho de 2014

O Caminho para Valsgarde XIII

Já estava escurecendo quando chegou na fazenda dos Land, fizera bastante esse caminho nos últimos tempos e esperava que continuasse sendo assim, gostava de lá, gostava deles. Eldorin desmontou seu cavalo e retirou sua bagagem que estava amarrada a cela, pendurou-a as costas e saiu dos estábulos. Não usava nenhuma capa, sentindo a brisa agradável ao seu redor, deu uma boa olhada na paisagem que ia desaparecendo na escuridão até alcançar o grande portal do edifício central da fazenda. Deixou suas coisas no balcão próximo e procurou se informar aonde estava o pai.
- Na árvore Skald, com o velho Lamm – disse a criada. Ele agradeceu e seguiu em frente, passando pela cozinha e saindo do edifício, quando alcançou a descida que havia, seguiu pela trilha até avistar a árvore mencionada, foi até lá e encontrou o mesmo círculo de amigos que presenciara um certo tempo atrás. Estavam envolta de uma fogueira recém acessa, próximo a ela havia uma mesa onde alguns mapas se encontravam estendidos com várias marcações e rotas. O velho Lamm estava curvado sobre ela, apontando lugares e lugares para Torkil, enquanto Lamark estava sentado ao pé da fogueira conversando com o pequeno Lanark, olhou em volta procurando o pai até encontra-lo mais à parte que os outros, encarando o céu crepuscular.
- Hmm, mande chamar os outros, Eldorin chegou, seja bem-vindo, filho – anunciou o velho Lamm quando o avistou.
- Obrigado – cumprimentou com um sinal de cabeça, passando pelos bancos de tronco, cumprimentando também Lamark e seu pequeno filho, indo em direção do velho e de Torkil.
- É bom revê-lo – disse Torkil, dando uns tapinhas em seu ombro, após agradecer as boas vindas dos Land, foi até o pai que ainda estava absorto com o crepúsculo. Tocou-lhe o ombro e ele voltou de seu devaneio, sendo surpreendido por um sorriso sincero em seu rosto.
- É sempre um orgulho para o pai ver o menor de seus filhos se tornar um homem – abraçou-o, Eldorin retribuiu satisfeito. Não vira Larza nem o seu sobrinho Eldred. O velho indicou que sentasse em um dos bancos, enquanto os outros chegavam para definirem os últimos ajustes sobre a viagem, estavam decididos a partir no dia seguinte. Esgmund, Guth e alguns outros homens de armas do velho Lamm estavam ali, quando o ultimo tomou seu lugar, ele começou a discorrer.
- Bem, meus amigos, é chegado o grande dia em que tanto nos preparamos. Todos aqui sabem do nosso objetivo, um objetivo que irá salvar nossa era. O pai de todos mostrou-nos Valsgarde em um sonho profético. Nossas volvas urgem com predestinação deste acontecimento e é nosso papel realizar esse dever. Aqui, tenho em minha frente – olhou-os - os grandes heróis da nossa Escandinávia. Nós iremos reergue-la, iremos salvá-la. Traremos mais uma vez nossa era de ouro. Mas para isso, temos muito trabalho a ser feito. Nosso primeiro objetivo é chegar a Valsgarde e encontrar o poderoso artefato abençoado por Odin. A única coisa que unira todo o real poder da Escandinávia em um poderoso punho sobre nossos inimigos é a lendária espada Balmung. Sim – disse, vendo alguns olhares – a espada que Sigurd usou para arrasar o terrível dragão Fafnir. Mas vocês já sabem do que estou falando, amanhã partirá nossa comitiva. Um barco apenas, uma viagem rápida e discreta. Ninguém fora daqui deve saber do que estamos objetivando. Muitos olhares em algo tão poderoso pode virar uma catástrofe, então tudo ao seu tempo. Partirá a nossa comitiva formada por 35 voluntários, dentre eles os meus próprios filhos, Lamark estará encarregado de encontrar o artefato, enquanto Torkil liderará essa expedição.
Alguns conversaram, pesando as decisões do velho Lamm, ele esperou que pensassem um pouco antes de voltar a sua fala.
- Valsgarde se encontra na Suécia, próxima de Uppsala, em Uppland, o lugar sagrado da Escandinávia. Vocês partiram pela costa norueguesa, seguindo as estrelas do oeste e em ao sul, acompanhando a costa sueca, até alcançarem o encontro do rio Fyris com o mar. Não será difícil encontra-lo, ele é muito usado para comércio, e algum de vocês, como Esgmund, já passou por lá mais de uma vez. Após encontrarem essa rota, seguiam pelo rio Fyris, provavelmente precisaram dar alguma satisfação ao porto sueco de Uppsala quando passarem por lá. Talvez alguns ainda lembrem de mim, mas deem alguma garantia de que estão em viagem de paz, eles não costumam ser complicados. Sigam a dentro até alcançarem a região de Oresund. – Ia falando e apontando nos mapas abertos na mesa a sua frente. – Aqui precisarão encalhar o barco e seguir a pé até a região do lago de Malarem. Encontrarão Valsgarde, é o sagrado cemitério antigo, é um enorme cemitério de barcos e até aqui posso guia-los. A espada estará lá, precisaram encontra-la no grande cemitério. – seria difícil, e talvez impossível encontrar algo assim na imensidão que se calculava ser Valsgarde, lendo isso nos olhos, falou - Mas não se deixem se desesperar, é o destino, e ele agira em seu momento, por enquanto, esse é o nosso dever. – encerrou.
Estava decidido e todos estavam de acordo. Conversaram noite adentro, enquanto jantavam a última grande refeição que teriam em dias. Lamark terminou de comer e foi chamado pelo velho, que estava com o inventário do barco para ser confirmado, quando Torkil o reteve – deixe-o comigo. – Disse – vá aproveitar sua noite com ela, ela precisa disso, e você também – sorriu e Lamark ficou grato por isso.
Deixou sua caneca de hidromel sobre a mesa e despediu-se dos amigos mais próximos. Subiu a trilha, passando através do grande salão, e uma sensação de saudade e despedida apertou-lhe o peito com antecedência. Passou pelo centro da fazenda, seguindo até a sua cabana, ainda havia uma luz acesa lá. Abriu sua porta com cuidado para não acordar ninguém. A casa estava silenciosa, andou por entre os quartos, verificando cada cômodo. Lanark estava dormindo e para a surpresa de Lamark, Helga também estava ali, adormecera em uma cadeira próxima a cama, com os pés apoiados nela. Pegou um cobertor e a cobriu, enquanto arrumava o lençol que Lanark durante o sono afastara de sua cama, cobrindo-o também, mexeu em seus cabelos e deu um beijo em sua testa, Lanark fungou durante o sono e virou-se na cama. Saindo o quarto, foi até o seu mas não encontrou Silned ali, caminhou até a parte dos fundos de sua casa e a encontrou ali. Estava sentada na relva baixa, olhando o céu que tremeluzia em luzes curiosas, comum em algumas noites na Escandinávia, era chamada de aurora boreal. Sentou-se ao seu lado e ela imediatamente encostou sua cabeça em seu ombro.
- Espero que isso seja um bom sinal – disse ela.
- E é. – ele respondeu.
- Eu vou sentir sua falta. – ela disse, passando o braço ao redor de seu corpo, deitando o rosto em seu peito.
- Lanark irá cuidar de você
- Eu estou falando sério – disse, se aninhando ainda mais em seus braços. Ele tocou o seu rosto, virando-o, para que pudesse olhar em seus olhos, não disse nada, apenas puxou-a para um beijo. Ela retribuiu, subindo as mãos para acariciar seu cabelo enquanto ele puxou-a ainda mais ao beijo, aproximaram-se até caírem para trás, deitando-se enquanto o beijo tornava-se uma sede desesperada nos lábios de cada um, sempre buscando mais um no outro, deixando a satisfação percorrer todo o corpo para cada beijo que era retribuindo. As mãos de Lamark iam agarrando o seu corpo, puxando-o para si, como se aquilo fosse uni-los para sempre, como se fossem tornar-se um só. E nesse momento, só o contato da pele quente do outro pode aliviar a dor de não poderem ser um único ser, incumbindo dedos desesperados de abrirem caminho entre as roupas para fazerem-nas irem embora. Abriu seu colete, desafivelando os nós que prendiam o decote em seu busto, deixando que soltasse os alvos seios dela. Beijou-os, estavam quentes e senti-los em sua pele era um deleite. Ela agarrou seus cabelos pressionando-o contra eles, deixando escapar suspiros de sua boca, puxou Lamark de volta para aliviar-se em mais beijos, suas mãos também procuravam tirar-lhe a túnica que usava, puxando-a de baixo para cima, para que passasse-a por sua cabeça. Abraçaram-se ainda mais, sentindo o corpo quente de cada um.
Mas nunca é o suficiente, e logo os beijos se tornam mais incansáveis, mais insaciáveis. As mãos procuram desesperadas descobrir qualquer parte do corpo, para que possam se encontrar ainda mais naquele abraço ávido. Subiu o seu vestido, passando a mão em sua coxa, apertando enquanto sentia ela se arrepiar com o toque do vento noturno. Ela desamarrou a presilha de sua calça enquanto o beijava, procurando o seu membro, para encontra-lo firme, quando o alcançou, puxou-o para fora. Continuaram o beijo enquanto se aproximavam ainda mais, Silned trouxe-o para entre de suas pernas para que sentisse ele roçar nela. Os beijos parecem tornar-se mais incontroláveis, sendo impossível fazer qualquer coisa sem estarem com os lábios juntos. Cada vez mais sentia o seu membro entrar dentro dela, agarraram-se e ele foi até o fim, sentiu ela apertar o cabelo de sua nuca e suspirar, suspendendo o beijo em que estavam. O seu quadril começa a mexer-se deixando que a cada volta perpasse uma sensação eletrizante entre ambos.
Vira-se, levando-o junto, para cima, montando sobre ele, inclinando para que continuasse a beijá-lo enquanto sentia seu membro todo dentro dela. Deslizando sobre ele, enquanto sua mão toca seu rosto, seu peito, acariciando com um misto de carinho e paixão. Até que parece que isso ainda não é o suficiente, movendo-se com mais velocidade, com mais força. Lamark a puxa e gira, virando-a para baixo, dessa vez ficando por cima, agindo com mais força, a beijando e mordendo enquanto seus corpos movem-se desesperados para se juntarem. Até que o beijo torna-se uma coisa ritmada com o corpo, e por um momento, parece que o corpo de ambos age em sintonia, eles finalmente tornam-se um só.
***
            Torkil havia explicado a ela que partiria em breve, mas que não se sentisse má por isso, e ela não se sentia realmente quando soube disso no começo, mas com o tempo que passou junto dele e das pessoas na fazenda, passou a vê-lo um pouco mais como pai, parecia que ela tinha mesmo uma família. E agora ele estava indo embora, e um certo rancor passou por sua mente. Ele foi acordá-la nesta manhã e a levou para quebrarem o jejum juntos. Serviu à na cozinha e sentou ao seu lado, comeram em silêncio enquanto ela ia pensando porque tinha de ser assim, porque os homens partiam e as mulheres ficavam? Porque ela não podia ir junto com ele?
            - Posso ir com você? – quebrou o silêncio. Ele a olhou e riu.
            - Pode.
            - Posso?
            - Não. – voltou-se para ensopado – Um dia te levarei em uma viagem, mas nesta não.
            - Porque?
            - É perigoso.
            - Mas você vai, se é perigoso, porque você não fica?
            - Porque – pensou um momento – se eu não for, as coisas podem ficar ainda mais perigosas.
            - E quem disse se eu não for não será mais perigoso também?
            - Sossegue, garota – respondeu – o seu papel é ficar aqui.
            - Não posso ter outro papel?
            - Não – pensou – não ainda. Pense nisso, pense em seu papel e quando voltar te ajudarei nisso, prometo.
            - E se você não voltar? – ela disse, meio insegura.
            - Eu voltarei – riu – eu tenho uma maldição de destino.
            Terminaram de comer, Torkil levantou-se e foi para fora, ver como estava o andamento do inventario, verificando então que já estava tudo em ordem e em seu devido lugar. Os empregados estavam preparando para desencalhar o barco e leva-lo para o pequeno cais, onde estavam descarregando as bagagens. Lamark juntou-se a ele.
            - Será uma viagem rápida – disse Torkil.
            - Duas semanas, talvez?
            - Talvez menos, o que irá demorar mesmo vai ser encontrar a coisa.
            - Eu não faço ideia de como faremos isso.
            - Nem eu.
            O velho Lamm veio caminhando, acompanhado por Esgmund, quando chegou perto deles, Esgmund cumprimentou e foi adiantar outras coisas da viagem.
            - Parece que está quase tudo pronto – disse o velho.
            - Sim – disse Lamark.
            - Tomem cuidado, estejam atentos, não sabemos se Olaf esta farejando pros lados da Suécia, é preciso que sejam cautelosos e sobre Valsgarde – olhou-os apaziguador – não se preocupem, vocês a encontraram.
            Concordaram e foram começar as despedidas. Lanark estava com Silned próximo do cais, quando Lamark voltou do barco após embarcar sua bagagem. Correu e o abraçou, Lamark levantou-o aos braços e brincou com seu cabelo – está crescendo feito um javali, olha só como esta pesado! –disse balançando-o nos braços, Lanark riu – sentirei saudades, cuide de sua mãe – beijou-o e o colocou de volta no chão. Aproximou-se de Silned, abraçando-a, sentindo seu rosto deitar sem seu ombro e um tímido beijo enquanto ela roçou uma última vez em sua barba.
            - Se cuide, e não esqueça, eu te amo.
            - Eu também te amo.
            - Aqui, eu e Lanark fizemos – deu um pequeno bracelete feito de couro trançado com um pedaço de madeira atravessado – eu entrelacei, e Lanark esculpiu essa espada.
            - Uma espada, é? – riu vendo o pedaço de madeira tosco.
            Torkil foi até Helga, estava sentada próxima do cais, assistindo a tudo, viu a despedida de Lamark e desejou que todos voltassem são e salvos, as vezes a dor é maior de quem fica do que quem parte. Também ficara apreensiva por Eldorin, gostava dele, era um bom amigo, sempre que visitava a fazendo, caminhava e brincava com ela e Lanark, mesmo não sendo muito bom nisso.
            - Estou partindo, mas voltarei, cuide-se. – Disse, meio sem jeito.
            - Por favor, volte, pai – sorriu – estarei te esperando.
            Torkil retribuiu o sorriso e se abraçaram, foi o primeiro abraço que recebeu dela desde que veio a Noruega, e pensou na última vez que fez isso, será que ela tinha um ano, dois? – obrigado.
Eldored e Eldorin vinham descendo do centro da fazenda. – Então, Vamos lá? – Perguntou Torkil, voltando-se para eles.
- Cuide do meu filho, Torkil – pediu Eldored.
- Eu não falharei dessa vez. – e ao relembrar de Eldar, lembrou de Larza e do pequeno Eldred. – Onde está Larza?
            Eldored olhou amargo para trás – ela não sai do quarto, não quer saber se partiremos ou não, me desculpe por arrumar uma hospede tão...
            - Não se preocupe – respondeu.
            - Ah, eu em envergonho de ter causado isso a vocês, mas, enfim – virou-se para Eldorin – Vá e represente nossa família nessa grande causa – abraçou o filho.
            - Não falharei – disse, indo ao cais, com sua bagagem as costas, antes disso deu um rápido aceno e um sorriso a Helga, que retribuiu tímida, quando voltou-se, Torkil encarava ele.
- Estou de olho em você, seu carniceiro.
Caminharam juntos, sendo recebido e cumprimentado pelos que já estavam no barco. Todos já haviam entrado, com exceção de Torkil e Lamark. O velho Lamm e Eldored foram dar o último adeus quando ambos entraram no barco. Cabeça de Lobo era como se chamava o grande barco dos Lands, Com um comprimento de 20 metros, o mastro erguia-se quase 10 metros no ar, com uma vela com listras brancas e azuis, pronta para ser desfraldada assim que ganhasse o alto mar e em sua proa uma cabeça de lobo arregalava os dentes vorazes aos ventos nórdicos.
            - Que os deuses guiem o caminho de Valsgarde a todos vocês. – Despediu-se o Velho Lamm quando os Torkil indicou que soltassem a corda e balançassem os remos. Cabeça de Lobo seguiu no mar tranquilo, e pela brisa ser leve, os remos iam e vinham, acertando a água, empurrando cada vez mais o barco ao seu destino. Cada um assumiu seu lugar enquanto atravessavam a grande baia que molhava as margens da fazenda, contornando, até ultrapassarem os fiordes que erguiam-se temerários e assombroso, e eles demoraram para saírem de vista quando fizeram o contorno em direção ao oeste. A viagem seria tranquila, pois não precisariam distanciar-se muito da costa, foram acompanhando a Noruega até o dia afundar-se no mar e continuarem seguindo, lendo as estrelas. Assim como o primeiro dia, o segundo não trouxe nenhum problema, com Cabeça de Lobo subindo e descendo as ondas que aqui e ali levantavam-se mais ousadas. Quando o vento ficou forte, descansaram os braços e soltaram a grande vela, que inflou-se e lançou o barco a frente.
            E assim os dias seguiram, umas vezes encaravam a imensidão azul que abraçava todo o horizonte à direita deles, outras o enorme céu, que conseguia ser maior que o oceano que navegavam e por fim sempre aquela última olhada para a linha distante que era a costa Norueguesa. No dia seguinte alcançaram a fronteira da Noruega com a Suécia, definida pela grande cordilheira montanhosa que divide o território de cada país. Constatando isso, aproximaram mais o barco da costa, para que não perdessem a entrada do rio Fyris. Acompanhando a via costeira sueca, não se via muita distinção entre ela e a Noruega, a não ser pelo frio que parecia ser bem menos severo para esse lado. A medida que seguiram, foi possível ver que o número de montanhas diminuía, dando lugar a campos mais abertos e verdes, até que, alguns dias observando a bela paisagem, conseguiram observar o encontro do rio Fyris. Nessas alturas, já estavam bastante próximos, mas com a cautela de não levantarem suspeitas, nem muito menos assustar ninguém. Aproximaram-se então da região sueca, entrando no país através do rio que corria grande e largo, dando espaço para que avançassem com uma boa velocidade.
            A vista sueca revelava um pais belo e agradável, aqui o frio não era tão rigoroso quanto seu país vizinho, com uma paisagem verde e aconchegante, para todos os lados podia-se observar os campos de relva sibilando com o vento e grandes árvores erguendo-se com grossa vegetação cercando-as. Mas esse espaço verde foi dando espaço para algumas fazendas. Nenhum fazendeiro pareceu incomodar-se com a passagem dos estrangeiros, demorando-se pouco tempo observando-os, logo retomando o trabalho na terra. Agora eles estavam remando, para que pudessem manobrar o barco com cuidado nas áreas rasas. Com um bom tempo seguindo pelo rio, observando as colinas verdes preencherem os seus arredores, começaram a avistar os sinais de que a grande Uppsala estava se aproximando. As pequenas começavam a dar lugar para verdadeiros edifícios engenhosos, com porto e barcos encalhados, em certa parte do percurso, precisaram manobrar para passar por dois barcos encalhados que quase trancavam todo o caminho. Desceram ainda mais, vendo os arredores da cidade surgir por onde passavam, até que enfim avistaram a grande Uppsala e realmente era enorme. A cidade possuíam grandes edifícios de madeira com belos adornos, um em especial destacando-se mais que os outros, ao longe, seu teto esculpido e bem trabalhado assemelhava-se a um grande barco de barriga para cima, a partir dele a cidade crescia repercutindo a beleza de cada casa erguida. Muito além, em uma distância que não poderia ser vista por onde estavam passando, havia três curiosas formações, três colinas erguiam-se lineares, com a mesma altura, uma ao lado da outra, onde alguns teimavam em dizer que eram os túmulos de Thor, Odin e Freya. E com toda a prosperidade que o condado de Uppsala revelava, era difícil duvidar disso. Quando se aproximaram, o elaborado porto possuía vários barcos aportados, revelando mais além um grande portão de madeira. A guarda responsável olhou curioso para os recém chegados, e como o Velho Lamm sugeriu, para dar as devidas satisfações. Era necessário explicar o que trazia estrangeiros adentrando o território.
            - Olá – Torkil anunciou quando pararam o barco na guarnição do portão – sou Torkil Landson, somos seus vizinhos, viemos da Noruega para uma expedição seguindo adentro pelo Fyris, para a região de Oresund. – O guarda encarou-o desconfiado.
            - E posso saber o que traz vocês tão longe de casa para o interior de nosso pais?           - Ainda há aqueles que persistem nos antigos costumes, Uppland é um lugar sagrado para muitos de nós, é uma viagem importante para os nossos corações. – o guarda pareceu compreender.
            - Entendo, Landson, espero que compreenda que precisaremos de uma garantia de que não irão perturbar a nossa paz. – indicou para o barco – quero hospedes que aguardem aqui na nossa guarnição o retorno de seu barco.
            - Nós compreendemos. – Virou-se para a tripulação – preciso de dois voluntários para passar alguns dias em Uppsala, quem? – nem todos estavam animados para suspender a viagem ao interior sueco, mas era um mal necessário. Guth e Frigg ofereceram-se para descansar e esticarem as pernas em Uppsala enquanto seus colegas não retornassem.
            - Voltaremos em breve – Torkil concluiu a negociação enquanto Eldorin e Alest ajudavam a passar algumas bagagem a Guth, enquanto Frigg ainda estava saindo do barco. O guarda deu o sinal aos responsáveis pelo grande portão, que foi aberto momentos depois da confirmação. Seguiram então viagem ao interior da Suécia pelo rio Fyris.
            Viajaram o resto daquele dia, até encalharei o barco e armarem um acampamento, partindo assim que o céu deu indícios de sua intenção em clarear. A viagem era mais vagarosa através do rio, manobrando nas áreas rasas e nas várias curvas, porém a paisagem que os cercava era tranquila e isso afetou o espirito deles. Realmente existia ali uma coisa especial, algo divino no ar em que respiravam, e isso enchia-os de satisfação. Porém, com mais um dia de viagem pelo rio, a paisagem começou a alterar-se, a vegetação tornando-se mais densa e menos amistosa, certos percursos do rio, o céu era coberto pelas grandes árvores que curvavam-se sobre a grande correnteza. A esta altura, já deviam estar próximos do lago Malarem, então era necessário encalharem o barco e seguirem a expedição a pé. Quando encontraram uma trégua da vegetação, aportaram. Todos desceram e prepararam o acampamento para mais uma noite. A densa vegetação passava uma tenebrosa impressão.
            - Tem certeza que é melhor pararmos por aqui? – perguntou meio incerto Eldorin a Lamark, enquanto um ia passando as bagagens e ferramentas para o outro ir retirando-as do barco.
            - Não temos muita escolha, Esgmund imagina que já estamos no ponto certo de desembarcarmos, isso se não tivermos passado do ponto. Mas não se preocupe, logo estaremos voltando para casa.
            - Não é isso, é só que tenho uma má impressão daqui.
            - Estamos em uma terra sagrada, tente não confundir a intenção dos Deuses.
            - Eu sei.          
            Procuraram galhos e troncos apodrecidos para fazerem uma boa fogueira, um dos homens já descascava algumas lebres trazidas na viagem, enquanto outro já preparava um caldeirão com água para ser fervido o ensopado. Apesar de cada um estar com sua ocupação, em cada íntimo, sentiam uma opressão no ar. Aquela era uma Floresta densa e obscura, encará-la muito os desencorajavam, fazendo com que se virassem e procurassem afastar esse tipo de pensamento.           
            Torkil estava no barco, observando os poucos vestígios do céu através de um pequeno rasgo no teto criado pelas enormes árvores. Ainda estava claro, muito embora onde estavam parecia já ser tarde da noite. Deviam estar pertos, Esgmund encontrara uma trilha que saia da clareira em que haviam resolvido parar. Estava tentando ver a direção em que a luz desaparecia no céu, para poder situar a posição e poderem partir com mais certeza do caminho que estavam trilhando, por sorte, o lago Malarem era gigantesco o que significava que invariavelmente chegariam a ele. Foi quando um grito puxou-o de volta de seus devaneios.
            Virou-se para o acampamento, os homens estavam reunidos ao redor de alguém caído, houve certa comoção, ouviu o som de lâminas abandonado suas bainhas e o gemido de alguma criatura. Pulou fora do barco e correu através do acampamento, abrindo espaço para ver o que acontecera. Nogzi, um dos jovens tripulantes que estava voltando da floresta com um tanto de lenha, estava no chão ferido, sua perna estava rasgada, entre frangalhos de sua roupa e de sua pele, enquanto do seu lado jazia um lobo rosnando em seu leito de morte, assim que meteu os olhos nele, Esgmund desceu o último golpe, sessando com sua vida.
            - O que diabos foi isso? – perguntou.
            - Eu não sei, esse lobo atacou Nogzi quando estava voltando da floresta, mas que maldição – disse Esgmund, cuspindo, limpando com as costas da mão o resto de saliva que escorreu de sua boca.        
            - Raios, alguém precisa cuidar desse ferimento – disse Torkil, procurando Yves, o responsável pelos cuidados medicinais da expedição. Se apressou, era pequeno e atarracado, carregava várias bolsas, abriu espaço entre os espectadores, ajoelhando-se e dando ordens para lhe auxiliarem, foi quando um uivo cortou o silêncio da floresta. Não era um simples uivo, era um tenebroso rugido, que reverberou no coração de cada um.
            - É uma alcateia. – disse Lamark.
            O uivo continuou rugindo alto e ameaçador até que foi silenciado. Todos encararam a escuridão entre as árvores e por um momento o único som foi o gemido de dor de Nogzi. Yves preparou ataduras enquanto tentava amenizar o máximo que podia o ferimento aberto pela mordida do lobo.
            - Mantenham-se juntos, eles não atacarão enquanto não nos separarmos, eles sabem que não podem conosco. – Disse Torkil. – Aumentem a fogueira.
            Escureceu e foi definida as vigílias para a noite, Lamark estava sentado à beira do rio, roendo os pequenos ossos de uma lebre, enquanto Torkil partia um pedaço de pão e lhe entregava.
            - Eu não esperava por isso – disse, pegando o pão.
            - Eu também não, mas eles não ousarão se aproximar.
            - Aquele ali pareceu bem ousado. – continuou Lamark, Torkil teve de concordar.
            - O fogo também irá afastá-los, fique de olhos abertos.
            Apesar da apreensão, a noite seguiu-se sem mais preocupações, a não ser por outro uivo, mas um solitário, do outro lado do rio. Quando amanheceu, dez ficaram para cuidar da embarcação e de Nogzi, o restante partiu. Subiram uma comprimida trilha entre as árvores, e por mais que tenham andado grande parte daquele dia, tudo que viam eram árvores e mais árvores. A paisagem escureceu rápida, e com ela, vultos mais escuros começavam a cruzar o caminho. Farfalhar de passos na distância eram ouvidos com maior frequência, porém foi com alívio que eles saíram da densa vegetação para encontrar um grande lago, o lago Malarem.
            Quando Lamark sentiu os pulmões encherem-se com ar renovado, toda a comitiva caiu de joelhos à beira do lago, aliviados, pois encurralados como estavam entre as árvores eram presas fáceis para uma matilha. No entanto foi com desgosto que outro homem gritou, o último a sair da borda da floresta, com um enorme lobo agarrado ao seu ombro, a criatura lançara-se no momento de descuido do pobre Svante ao se animar em sair da floresta. Caiu de joelhos, agarrando as orelhas do animal, mas a criatura girava sua cabeça para todos os lados, aumentando o ferimento, outro lobo surgiu, mordendo o calcanhar de sua vítima, puxando-o e arrastando-o para dentro da floresta. Svante caiu de cara no chão, enquanto o primeiro lobo preparava outra mordida. Foi quando Esgmund lançou um de seus machados no animal, que pegou de mal jeito, resvalando no grosso pelo cinzento. O lobo abocanhou a nuca de Svante e um ‘’ track’’ ressoou do corpo agora inerte de Svante. O animal virou-se e rosnou para eles, enquanto o outro arrastava o corpo para a floresta. Esgmund lançou-se sobre o lobo, mas esse esquivou-se e desapareceu na densa mata, não havia nenhum vestígio sequer do ataque, a não ser pela trilha vermelha feita pelo corpo em direção a borda da floresta.
            Passaram aquela noite com três grandes fogueiras acessas, encarando a floresta, com o grande lago estendendo-se as suas costas.
            - Como eles foram capazes de fazer aquilo? – inquiriu Esgmund, indignado.
            - Aqueles desgraçados estão confiantes, aqueles malditos animais são piores do que nós em uma caça. – suspirou Torkil. – se continuarmos dando espaço, eles continuaram avançando, cada um tenha a sua tocha e, pelo bom olho de Odin, fiquem atentos.
            Partiram cedo aquela manhã, seguindo ao longo do Lago Malarem, era enorme, parecendo uma porção do mar, sendo quase impossível ver o seu outro lado. Na medida em que continuavam a caminhada, as árvores iam dando mais espaços, até ficarem contidas em pequenos conjuntos. Com uma visão mais ampla do ambiente, não demoraram em percorrer uma boa distância. Porém, quando a noite desceu, foi com certo temor que passaram o resto dela encarando olhos vermelhos indo e vindo na escuridão, tímidos demais para se arriscarem.
            No dia seguinte, partiram assim que o sol tocou a barriga do céu. Afastaram-se do Lago, seguindo por um campo aberto, subindo e descendo algumas colinas que deixavam o vento suspirar por entre a relva. Então a paisagem foi se alterando, com contornos montanhosos desenhando-se na distância, o conjunto de árvores novamente voltava a tornar-se denso, enquanto ao meio de tudo uma grande mudança de relevo descia, formando um caminho que levava as montanhas mais além. Seguiram cautelosos a medida em que iam descendo pela trilha. O farfalhar voltou e o som inquietante mexia com eles. Estavam desprotegidos e vulneráveis andando ali, obrigados a seguirem em uma fila. Quando o Sol começou a deitar o rosto no horizonte, jogando sua grande sombra na medida em que se escondia atrás das montanhas, os uivos retornaram.
            Foi então que saltando da borda da floresta, um enorme lobo cinzento aterrissou voraz a frente deles, era incrivelmente grande, do tamanho de um homem, rosnou e uivou, era um sinal. Ao redor deles, lobos saltaram, e era apavorante a incrível quantidade que existia daquelas criaturas ali. Se eles eram 18, havia quase o dobro de lobos, parecendo um formigueiro caindo em cima de um pedaço de fruta. Esses animais astuciosos eram perigosos e estratégicos que trabalham em matilha, perseguindo e estudando suas presas, vendo o ponto fraco e o deslize, prontos para aproveitarem qualquer descuido. Estranhamente ali estavam realmente confiantes e ousados, provavelmente acompanharam a comitiva por todo o percurso, esperando o melhor momento para ataca-los.
            Eldorin instintivamente virou suas costas, deixando a mordida do animal raspar pela bagagem que estava em suas costas, passou rolando mas já virando em pé para ele. Nesse tempo sacara sua espada e deslizara em direção ao lobo, ganhando espaço, até que o animal saltou novamente sobre ele, deixou-se cair com a espada levantada em direção do lobo, que, quando caiu com a boca arreganhada cheia de dentes para mordê-lo, foi vítima do próprio peso sobre a lâmina, Eldorin terminou o serviço, encravando a espada até o cabo, depois empurrou o animal morto para o lado e viu seus companheiros em uma luta selvagem contra as malditas criaturas.
            Lamark também já matara um dos lobos, quando outro saltou em sua direção, foi preciso no momento em que abaixou-se, deixando o animal cair para os lados, virando no ângulo perfeito para atingir o animal com sua espada, correu para auxiliar Esgmund que caíra para trás com um outro agarrado ao seu braço. Seu golpe desceu com força no crânio do animal, que amoleceu a mordida e foi lançado longe por Esgmund, que levantou-se com ajuda, agarrado ao antebraço, mas ainda com a espada firme em mão.
            - Esses lobos precisam ser esfolados, mas que merda – disse, vendo o sangue escorrer por entre o punho que acabara de levantar – fez um maldito estrago.
            - Você está bem? – perguntou Lamark, tentando encontrar Eldorin na confusão que se desenrolava.
            - Não se preocupe comigo – disse Esgmund, colocando o escudo – não podemos lutar individualmente com eles, precisamos nos reunir.
            - Tem razão – concordou Lamark – Aqui, todos aqui! – gritou, chamando a todos – raios, todos para cá! Mas que merda, onde está Torkil?
            O grande lobo cinzento que pulara a frente da comitiva avançara sobre Torkil que ia guiando a expedição. Torkil foi rápido, rechaçando o golpe com o punho da espada que foi sacada no preciso momento que o animal aproximara-se. Era o macho alfa, o líder que coordenava aquele ataque e certamente, se ele fosse morto, provavelmente os outros fossem embora. Por isso avançou sobre ele, mas o esperto animal, recuou deixando os golpes passarem no ar, e, usando de sua versatilidade, saltou sobre ele assim que viu seus golpes desferidos em vão. Caiu sobre ele, os dentes prendendo-se em seu ombro, o enorme peso jogando Torkil ao chão, parecia que lutava com um homem, tamanho era o lobo. Porém os dentes do animal não encontraram caminho para a carne por baixo da cota de malha, tentando então balançar a mordida para estraçalhar o couro terrivelmente duro que ele encontrara.
            Torkil socou a barriga do animal que não se deixou desanimar enquanto tentava arrancar-lhe a carne. A curta distância em que estava não tinha como agir com sua espada, largou-a, tentando alcançar o punhal que escondia em sua bota, mas era difícil com aquele lobo do tamanho de um urso em cima dele. Começou então a sentir os primeiros dentes a romperem os elos de sua cota de malha, as patas do lobo cravando-se em sua roupa na medida em que prendia os dentes cada vez mais nele. As patas coçavam e rasgavam, atingindo seu rosto, abrindo um corte transversal por sua boca ao queixo.
A dor não o atingia, estava com o sangue muito quente enquanto tentava alcançar o punhal, tentando então girar para o lado oposto e então lançar-se. O lobo prendeu seu ombro quando tentou esticar-se, mas foi o suficiente para agarrar o punhal. Voltou-se enfiando o punhal através de vários socos na barriga do lobo. A princípio, a mordida apertou ainda mais, até que começou a vacilar, e por um momento, pareceu que o animal pensou em desistir, mas um lampejo em seu olhar quis dizer que morreriam juntos ali, mordendo, determinado a arrancar a vida de seu inimigo também. Percebendo que o animal não lhe largava o ombro, pressionou ainda mais o punhal contra a barriga, porém sentiu sua mão vacilar quando mais uma presa rompeu outro elo, metendo os dentes em sua carne, com uma pressão que nunca sentira antes, se não saísse logo dali, teria seus ossos fraturados.
 Foi então que em um último gesto desesperado puxou o punhal que furara o lobo o máximo que pode e por um segundo seus olhos se encontraram. Os olhos do lobo eram castanhos, e eles pareciam humanos, na medida em que retribuía o seu olhar, e naquele trocar de olhares, pareceu que perdeu-se o tempo em uma eternidade até que o animal fechou-os quando Torkil conseguiu arrebentar sua carne, abrindo um grande corte de cima a baixo, na lateral de sua barriga até as costelas, partindo uma ou duas com a força em que puxara.
Lamark estava olhando em volta, para ver quem ainda não conseguira se reunir ao grupo, quando sentiu o medo atingir o coração como uma flecha disparada da escuridão; Torkil era um dos corpos jogados pelo chão. Saiu da formação, e ainda que um ou dois lobos tivessem vindo em sua direção, acertou um com a boça do escudo e o outro com a ponta da espada, abrindo caminho até o irmão, estava sob o enorme lobo que avançara sobre a comitiva. Ao se aproximar viu o enorme lobo estremecer, firmando a espada em punho e levantando o escudo, pronto para agir caso o animal avançasse sobre ele também. Foi então que o lobo saltou, só que um salto estranho, caindo para o lado de Torkil. O alivio estremeceu seu braço, fazendo soltar a espada, quando viu Torkil levantar-se. 
Estava agarrado ao ombro, o corpo coberto de sangue, no qual percebeu, grande parte não era dele mas sim do enorme lobo que agora jazia morto aos pés deles. A matilha farejou e rosnou quando viu o corpo do líder, intimidaram-se e partiram, disparando como um raio para dentro das árvores, não antes que um último remanescente rosnasse como se quisesse dizer que aquilo não iria ficar assim. Lamark foi ajudar o irmão.
- Acho que tirei o ombro do lugar – rosnou entre os dentes, pressionando o ferimento – aquele diabo tem a força de três homens, mas que maldição.
- Você ficará bem – disse Lamark, passando o bom braço de Torkil por sobre o ombro, ajudando a leva-lo aos outros, que também se aproximavam.
- Muitos feridos? – perguntou.
- Alguns – respondeu Lamark – alguns mortos.
Sentaram-no encostado em uma árvore, enquanto tentava endireitar as costas e tampar o sangramento. Ajudaram a tirar seu gibão e sua cota de malha, travando os dentes tamanha a dor que sentia martelar em seu ombro, um choque que fazia com que encolhesse o braço o máximo que podia, dificultando ainda mais tirar sua roupa. Quando finalmente conseguiram, viram o belo estrago que havia sido feito, o lobo conseguira penetrar quatro dentes em sua carne, dois na frente e dois as costas, no entanto, realmente não conseguira ir mais longe que isso, o verdadeiro dano estava na força em que fora empregada, deslocando o ombro. Estava torto, com o braço caído, abaixo da linha normal de seu busto. Após derramarem uma boa quantidade de água quente sob os ferimentos, constatando que realmente não estavam tão profundos, voltaram a atenção ao ombro.
  - Ele precisa colocar mesmo o ombro no lugar –disse Esgmund, que acabara de lavar o braço com um pouco de água, enfaixando-o, sendo possível observar os pequenos furos vermelhos surgindo sob a atadura. – O maldito Yves ficou para trás, mas acho que sei dar conta disso, venham cá. Lamark, vou precisar de sua ajuda.
Puxaram Torkil, deitando-o no lugar mais regular que conseguiram encontrar, após Esgmund apalpar bastante o ombro, sentindo onde havia o deslocamento, pediu a capa de alguém, dobrando-a de forma que parecesse uma grande faixa, passou uma ponta por baixo do ombro enquanto outra vinha por cima, de forma que pudesse laçá-lo. Indicou que Lamark segurasse o braço, enquanto Eldorin agarrasse os pés de Torkil.
- Quando eu mandar, puxem com força.
- Você sabe o que está fazendo? – Perguntou Torkil. Esgmund olhou para ele, olhou para o ombro, para Lamark e para a capa que estava prestes a puxar. – Eu não sei, acho que sim.
Então puxaram, Torkil gritou, Esgmund fez força enquanto Eldorin e Lamark também fizeram, até ouvirem com sonoridade o ombro estalar. Então Esgmund aproximou-se, pressionando o peito, enquanto recolocava o ombro, mais um estalo e estava feito.
- Pronto – sorriu, vendo a cara de dor de Torkil – agora só precisa mantê-lo em repouso.
- Repouso – Torkil riu, enquanto delirava de dor.
Passaram a noite ali, no meio da pequena trilha. Uma grande pira foi acessa, com os corpos daqueles que caíram. Não dormiram, e assim que conseguiram acalmar os nervos, com a chegada do alvorecer, deram continuidade a caminhada. Estavam próximos, ao que tudo indicava, o grande vale mais além, nos contornos montanhosos, deveria abrigar o grande lago Valsgarde. Seguiram pela trilha, que cada vez mais se alargava, revelando o vale a frente, uma circunferência montanhosa que parecia abraçar um grande lago na distância. Torkil andava, sentindo a luxação em seu ombro morder seu corpo, vacilando vez em outra em seu passo. Eldorin ficara ao seu lado, para tentar lhe prestar qualquer assistência, mesmo que ele insistisse que não precisasse dela. Encerrado mais um dia de caminhada, calcularam que no próximo estariam finalmente chegando em Valsgarde. E com resiliência renovada partiram no dia seguinte, agora adentrando no vale, passando por uma vegetação menos densa, mais espaçada. As árvores não eram grandes e tenebrosas, pelo contrário, parecia que ali era um lugar sagrado. Algo novamente encheu os espíritos deles, fazendo com que seguissem essa caminhada sem muito esforço. Quando por fim saíram da cobertura das árvores puderam encarar pela primeira vez o grande lago Valsgarde.
Era imenso, um lago negro que parecia cobrir todo o horizonte, não fosse pelas montanhas que parecia contorna-lo, como uma mulher que segura uma grande bacia. Devia ser terrivelmente profundo e a nevoa que subia de sua água emanava uma tensão e um mistério reverente. Porém, sua superfície não era lisa, era infestada por grandes embarcações escandinavas, um grande cemitério de barcos. É costume não só na Noruega, como também em todos os outros países escandinavos, o sepultamento de um grande senhor ser realizado em seu barco, com todos os bens que possuía. Alguns eram enterrados, outros eram incendiados enquanto partiam para sua última viagem ao longo das misteriosas águas, aqui, no entanto era diferente. Dizem que somente os grandes heróis nórdicos vieram para as águas de Valsgarde, e que nenhuma chama conseguiu queimar nenhum barco aqui, todos ficaram intactos, e por isso dizem que é um lago sagrado. Apesar disso, aqui e ali, havia embarcações ao meio, outras com a barriga para cima, outras encalhadas na areia, e muitas outras aos pedaços. Era terrivelmente sinistro observar aquela grande circunferência pontilhada para todos os lados por fragmentos de barcos.
- Valsgarde – suspirou Lamark.