Para os seus pais, Elizabeth Cather teve o melhor destino
possível, apesar do pobre condado onde seu pai era senhor, conseguiu casar-se
com o príncipe Derick Donsaint, senhor das terras ao sul da Normandia, terra
esta que poderia vir a se chamar de Inglaterra, mas nessa época ninguém pensava
nisso, pelo menos não nessa historia. Ainda assim, não era surpresa alguma tal
conquista, pois sua sutil beleza cativou o desejo de muitos homens, e entre
eles, o príncipe. Seu pai chorou de
alegria e alívio ao ver o primeiro beijo do casal em seu grandioso casamento, e
não só ele, como também muitos outros, vendo par tão perfeito, ela, com
seus olhos tão profundos e fortes,
cabelos negros cascateando em uma coroa de rosas, em uma sereno contraste com
sua pele tão branca quanto a pérola em sua aliança, sustentando o olhar de uma
forma tão harmoniosa com o do príncipe Derick, seu homem, príncipe, senhor e
rei. Mas não foi assim.
A primeira noite foi carregada de lágrimas, sangue e dor. O
príncipe a maltratou tanto que não é válido descrever o que lhe foi infligida,
basta saber que o que aconteceu em uma só noite foi capaz de destruir a vida
inteira de uma garota que podia ter sido feliz.
Ferida, tremendo, rasgada, a sensação de ter sido invadida, de ter sido destruída
por dentro a corroia, e mal se deu conta quando percebeu que estava sendo
arrastada, puxada pelos cabelos até a igreja pessoal do príncipe. Lá foi jogada.
-Reze pelos pecados que cometeu hoje! – Disse, dando um
forte chute em seu estomago. Apesar da
descrença de que aquilo poderia ser real, perguntou:
-Mas – disse, enquanto tentava puxar algum pouco de ar – mas
que pecado? Você, vo...- Ela foi atingida por um soco.
- Ora, você, pecadora, me fez cometer tudo isso! Me fez ser impuro!
Agora pague por isso e reze! – E a chutou novamente.
Ela parou ali e chorou. Chorou e rezou.
O padre Justino Cavalcante estava outra vez impaciente com a
pouca arrecadação que conseguira extrair dos camponeses da redondeza para a
reforma da igreja. Aparentemente ela não precisava de reforma, mas ele dizia
que era necessário uma peça de prata vinda do Santo Padre, de Roma, para
abençoar esse lugar, e para isso precisava de muitas moedas, o que não
conseguia ali. Precisava falar com o príncipe, ele entenderia e daria um jeito
de aumentar os impostos, era preciso. Um pobre diabo esbarrou em sua perna.
-Santo padre, dai-me do que comer – Chorou o infeliz.
-Não – afastou o pé com nojo – mas rezarei para ti, que Deus
lhe abençoe.
Os guardas no portão não se importarão com sua passagem, mas
barraram com extrema violência uma camponesa que vinha pouco depois dele.
- Está no jardim. – disse uma mulher bela, com os lábios
cortados e marcas pelos braços, mas bonita, ainda assim, admirou-a, e
desejou-a, imaginado coisas que transcendiam sua batina. Cumprimentou-a antipaticamente
e dirigiu-se para o Jardim. O padre se encabulou um pouco quando encontrou o príncipe com as mãos
embaixo das saias de uma das empregadas que estavam com ele, sorriu ao vê-lo.
- Ora padre, quer também? – Justino empertigou-se e ficou
vermelho de raiva, mas conteve-se, lembrando de seu propósito.
-Sabe que não admito isso, meu senhor, venho aqui pedir algo
importantíssimo! – O príncipe afastou a mulher com um tapa em suas costas, onde
saiu assobiando da dor na mão pela força usada.
-Diga, padre, e eu concederei.
-Preciso do artifício do Santo padre, senhor, se não essa
terra não terá benção! – Disse, como se carregasse a cura da doença em suas
palavras. O príncipe sorriu, e o padre soube que era bom.
-Conseguirei seu dinheiro, e , o que é isso? – sorriu, pois
tinha identificado perversão em seu olhar. – olhando para minha princesa?
O padre encabulou-se todo, em um misto de surpresa e ofensa,
mas não adiantava, tinha sido pego e só Jesus poderia livrá-lo de tal vergonha.
Mas sentiu um prazer crescer e dominar seu membro viril, porque aquele sorriso
sugeria coisas melhores.
- Padre, sabe que o que quiser, pode pedir, pois tudo que é
meu é da casa de Deus. – e apontou para onde o padre evitava olhar, para ela. Elizabeth.
Um mês se passou até chegar o dia em que a peça abençoada
chegasse a Igreja, nesse dia houve louvores e comemorações, o dia em que Deus
abençoou a todos, não bem todos. A Igreja resplandecia e todos gozavam de
conforto e bem estar, pois estavam certos de que o olhar de Deus recaia ali e
deleitava-se com o que via.
Elizabeth não tinha ido a comemoração e nem havia saído do
quarto naquele dia, decidira rezar do seu cômodo, e teve a sorte de conseguir
pois segundo o padre Justino, era uma ofensa ter a presença de um ‘’objeto’’
tão usado por todos. Quando bateram em sua porta, de alguma forma sabia o que
era, tentou ser forte e encarar quem entrava, mas quando a porta se abriu, não
resistiu o choro.
Era noite quando foi levada para a igreja. Dois Guardas e um
monge a carregavam as escondidas. Quando entraram nos fundos da Igreja,
passaram uma corrente em seu pescoço e o monge a arrastou. Ela perdeu a conta
de quantos cômodos passou até entrar em um cômodo escuro e ser jogada lá
dentro, com a corrente pesando em seu pescoço. Sentou se no chão gelado e
tentou retirar à corrente, em vão. Quando seus olhos acostumaram-se a
escuridão, feriu-os com a luz de uma vela que surgiu em meio ao breu e através
da nova fonte de luminosidade, viu o silencioso padre Justino balançar o fósforo
no ar para apagar a ponta em chamas enquanto olhava para ela de forma dura e inquisitória.
- Deve saber o porque está aqui, Elizabeth.
-Eu devo ter pecado, senhor.
-Ah, sim, e parece que não andou rezando o suficiente.
-É... parece que não... – Disse, sem forças, sabendo o que
estava por vir.
-Cuidado com sua língua!- Disse o padre, agarrando seu rosto
cruelmente com a mão, espremendo até sentir as lágrimas escorrerem por entre
seus dedos. – Darei uma melhor função a ela, sua cadela do diabo! – largou-a no
chão e começou a rasgar suas roupas com uma adaga. Elizabeth suspiro com o aço
frio em contato com sua pele. O padre empertigou-se enquanto levantava a bata e
procurava alcançar seu membro viril embaixo de tantos panos. Alegre por enfim alcançá-lo,
pegou-o e segurou-o bem como que com medo de que pudesse fugir e apontou-o para
ela, feliz.
Então começou.
Gritos começaram a surgir da escuridão como sombras surgem
ao aparecimento de alguma luz. O padre parou, afrouxou a mão e os tecidos o cobriram
novamente.
-Mas que demônios, Jesus, esta acontecendo lá fora? – A
duvida começou a perder lugar para um medo. Os gritos agora eram de fúria. A
perplexidade dele fez Elizabeth sorrir inconscientemente, não se preocupando
com a sua vida, mas ver o medo no rosto do santo homem era impagável. O padre
irou-se
-Foi você, não foi? Bruxa fodida! – Disse, puxando a
corrente de Elizabeth, mas nesse exato momento a porta escancarou-se,
esbarrando em seu rosto, jogando-o para trás. O quarto encheu-se de fúria e aço e o padre
foi feito em pedaços em relâmpagos de luz refletidas nas laminas. Elizabeth ficou pasma com a explosão a sua
frente e preparou-se para o fim quando foi encarada pelos tenebrosos intrusos.
Encararam-na mas não a despedaçaram, como ela pensou que fariam, imaginando ser
demônios que vieram acabar com tanto pecado. Mas eles sorriram e pegaram ela,
jogaram-na em seus ombros e a carregaram, como um saco de espólio. Ela estava abismada
‘’me levaram para o inferno por tudo o que fiz, ó, meu doce senhor!’’.
Rapidamente estavam fora da igreja, jogaram-na junto de outras mulheres e ela
viu o príncipe, o seu príncipe.
Ele estava com espada em punho, gritando por soldados, mas
todos estavam fugindo ou mortos. O homem que tinha carregado ela, virou-se para
um dos que estavam com ele e disse algo em uma língua que ela não entendeu,
agora que estavam fora, viu que eram homens do norte, vestidos em aço, uns com
espadas, outros com machados, carregando escudos redondos, cada qual com
desenhos e cores em mil variações. Ela sabia disso porque seus pais lhe
ensinaram sobre eles, sobre seus ancestrais do norte. O homem do norte jogou o
elmo para um dos companheiros, jogou o escudo para o outro e dirigiu-se para o
príncipe, com um machado em mãos. Ele mandou os outros se afastarem e parece
que riram e obedeceram, eles estavam se divertindo com isso, porém o príncipe
não, nem um pouco, por sinal. O homem gritou algo que ela não compreendeu e
parece que o príncipe também não, mas pelos gestos, entendeu-se que era uma
luta entre os dois.
O príncipe partiu para cima do homem do norte, brandindo a
espada, calculando o golpe perfeito, porém este se deslocou com facilidade para
esquiva-se do golpe, desferindo em sua canela uma machadada. O golpe foi forte
e o príncipe vacilou, caindo de quatro. Os homens riram e o homem do norte
chutou sua bunda, enterrando sua cara na lama. Mandou que se levantasse, mas
ele ficou e chorou no chão. Era uma cena cômica, e até os camponeses sitiados
gozaram do acontecimento, mesmo estando à beira da morte. O homem do norte
agarrou os cabelos loiros do príncipe e o puxou para que se levantasse, quando
finalmente ergueu o humilhado, havia tufos loiros em sua mão. Porém, quando mal
percebeu, o príncipe cravou uma adaga em seu estômago. O homem do norte ficou
sem acreditar, dobrou-se, caiu no chão e ficou lá. Um ‘’ohhhh’’ soou entre os
expectadores.
O príncipe riu e quando conseguiu reunir confiança para
desafiar outro inimigo, uma flecha soou e cravou-se em sua garganta. Não
acreditou, então outra brotou em seu peito, tamanha era a velocidade que mais
parecia que nascia dele, e então mais uma, e outra, e logo estava de joelhos
com várias flechas no corpo. Gaguejou algo, mas o sangue gorgolejava em sua
boca, então, não entendeu quando todos caíram na gargalhada, o homem do norte,
que ele havia matado, se levantara e estava rindo com os outros, vários
companheiros correram para ele e riram juntos da pegadinha que havia pregado em
todos, a maldita adaga do príncipe sequer atravessara a cota de malha do sujeito.
Todos estavam rindo e o abraçando, enquanto o príncipe encarava suas mãos ensanguentadas.
Elizabeth levantou-se e saiu em direção ao príncipe, os
homens do norte não se preocuparam em detê-la, todos estavam rolando de rir
para lá e para cá. Pegou uma espada qualquer e dirigiu-se até lá. Os homens
pararam de rir quando ela chegou perto, mas o tal sujeito do norte fez um gesto
como que para indicar que não a interrompessem. Ela foi até o príncipe. Ele não
tinha palavras, mas seus olhos ainda estavam cheios de frases. Ela colocou a
espada em sua garganta e desceu-a, demorou, porque era difícil, mas conseguiu,
e quando o fez, todos estavam rindo muito mais, e aplaudindo-a. Alguém chegou e
a agarrou e fez como que dançasse, ela não sabia o que fazer, tudo era um
turbilhão de coisas, suas roupas estavam rasgadas, suas mãos sujas de sangue,
tudo queimava, mas ela encontrou paz naquele caos.
A ultima vez em que ela olhou para a vila, o corpo do
príncipe estava amarrado de cabeça pra baixo em um pedaço de pau, nu como um
porco. A vila estava sendo atacada e a
igreja queimava, e ai Elizabeth soube que rezou o suficiente.